"E se acaso falo com alguém longinquo, e se , hoje nuvem do possivel, amanhã caires, chuva do real sobre a terra, não te esqueças nunca da tua divindade original de sonho meu. Sê sempre na vida aquilo que possa ser o sonho meu. Sê sempre na vida aquilo que possa ser o sonho de um isolado e nunca o abrigo de um amoroso. Faze o teu dever de mera taça. Cumpre o teu mister de ânfora inútil. Ninguém diga de ti o que o rio pode dizer das margens, que existem para o limitar. Antes não correr na vida, antes secar de sonhar.
Que o teu génio seja o ser supérflua, e a tua vida a arte de olhar para ela, de seres olhada, a nunca idêntica. Não seja nunca mais nada.
Hoje és apenas o perfil criado deste livro, uma hora carnalizada e separa das outras horas. Se eu tivesse a certeza de que o eras, ergueria uma religião sobre (o sonho) de amar-te.
És o que falta a tudo. És o que cada cousa falta para a podermos amar sempre. Chave perdida das portas do Templo, caminho / enconberto / do Palácio, Ilha Longínqua que a bruma nunca deixa ver..."
...Livro do Desassossego, Bernardo Soares
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